Sem polarização: na TV norueguesa, programas vetam bate-boca em debates

Como diálogo não é só falar, duas diferentes atrações exigem que participantes ouçam uns aos outros. "Parece terapia de casal", diz jornalista

04 de setembro de 2019 4 minutos
Europeanway

Bastante evidente no Brasil nos últimos tempos, em particular desde as eleições de 2018, a polarização política é um fenômeno global – o que não significa que seja irreversível. Em um exemplo de que há gente tentando retomar a fundamental prática do diálogo, dois programas de TV noruegueses exibem debates em que há duas regras básicas: é proibido interromper seu interlocutor e é obrigatório tentar enxergar o tema a partir do ponto de vista de seu oponente.

Os criadores dos dois programas decidiram tentar uma nova abordagem para a discussão de temas políticos no momento em que o país se prepara para as próximas eleições municipais, marcadas para o dia 9 de setembro. E se essa abordagem soa como "fora da caixa" para os ruidosos tempos atuais, o fato é que elas impõem algo óbvio para a boa convivência entre diferentes: diálogo significa escutar, e não apenas falar (e xingar, e desqualificar).

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"Depois de quase dez anos apresentando debates políticos, percebi que o formato estava saturado, os políticos estavam saturados e eu estava saturada com tanta briga", disse à agência Reuters a jornalista Ingunn Solheim. Foi dela a ideia de criar o Einig? (ou "De acordo?", em tradução livre), programa que estreou em agosto na emissora pública NRK.

Na atração, políticos ou ativistas têm que respeitar as regras básicas ao discutirem temas como "o número de abortos precisa diminuir" ou "os imigrantes não querem se integrar à nossa sociedade". Em uma evidência de que os participantes precisam de fato se respeitar, o debate ocorre sem a presença de um moderador.

O resultado? Os ativistas contra e pró-aborto tendo uma discussão ponderada sobre os dilemas de se interromper uma gravidez e os participantes do debate sobre imigração concluindo, às lágrimas, que têm mais em comum com seu "adversário" do que eles esperavam.

"Parece um pouco uma terapia de casal", disse Ingunn Solheim à Reuters. "Estamos tentando fazê-los ouvir uns aos outros e explorar diferentes pontos de vista em vez de se atacarem. E se você sentir que seu parceiro te ouviu e te entendeu, é mais fácil fazer a mesma coisa de volta."

Raciocínio semelhante foi adotado para a criação de um novo quadro no Supernytt (ou "Super Novo"), um noticiário de TV para crianças que existe desde 2010. O novo segmento do programa já recebeu a primeira-ministra Erna Solberg e outros políticos para discutir se as escolas deveriam abolir a lição de casa ou se deveria haver pedágios para limitar o tráfego nas cidades, um tema importante para a eleição deste ano.

As regras do programa, também da NRK: não use palavras complicadas, não culpe os outros, levante sua mão para dizer algo, não interrompa e diga algo positivo sobre seus rivais. "Quando há brigas, é impossível que as crianças entendam – e, para ser honesto, isso também vale para os adultos", disse Frank Sivertsen, editor do Supernytt.

O resultado é um ambiente mais descontraído, com os políticos explicando temas complexos de uma maneira compreensível, conta ele. "Os participantes tiveram que se manifestar com uma linguagem mais direta. Isso dificulta a fuga de um tema difícil."

Alguns espectadores aprovaram o resultado. "Gostei muito dos dois programas", disse Astrid Bergmaal, de 37 anos, em sua casa no leste de Oslo, com seu filho de 7 anos, Mathias. "Eles ouviram um ao outro de uma maneira completamente diferente do que em outros programas, e você obtém respostas muito melhores."

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